quarta-feira, 2 de março de 2016

[Fotografia de Miguel Leitão Jardim, a partir da qual foi elaborado o poema que se segue. As excelentes fotografias do Miguel podem ser vistas aqui: A Gaivota Existencialista.]

tomai uma casa
pode ser um cubo ou um labirinto com anexo
uma tenda ou uma pirâmide flutuante

uma figura
– de gramática – geométrica
torcionária
como só acontece aos lugares onde se sobe
onde se desce
– como nas idades feitas pontos cardeais
deitados à roleta dos cata-ventos

uma casa – a casa
[de sépia – de cores que se precipitam
com escadas ou alçapões riscados ou por riscar]
há-de ser vergada pelas mãos firmes do tempo
– de uma mulher – de uma criança

nela tudo se cria – tudo se desconjunta
parte-se o pão – divide-se o pão
baralham-se as mãos – tornam-se a dar

pode ter portas ou seteiras
pontos de fuga ou de vácuo
esquinas – vértices – facas – agulhas

testas rachadas quando não se repara adiante
raias de deflagração
dedos furados – casas armadas – botões cosidos

a casa – esta casa
olhai
o seu padrão de filigrana
embutido nas rosáceas dos corações

um homem entra
– ou sai do mundo –
[isto – nesta casa – nunca é claro
seja durante a apanha de despojos
ou na vigília do rancor]
e espera
as mãos bordadas atrás das costas
o peito coberto à luz

e reconhece
– venha o que for de vir