no regresso do discernimento
meu regresso?
meu discernimento?
não sei
não ouvi o galo
anunciar as matinas
– como quem ergue o homem
não vi a lagartixa
cuspir nas pedras
– como quem guia o homem
não ordenei a um ermo ou a uma floresta
para se fazerem e ao seu contrário
– como quem alimenta o homem
mais além não suam deuses
nas molduras das paisagens
– como quem acredita no homem
não senti os cães
a ladrarem nas vespertinas
– como quando se iça no fim dum baraço o homem
não sei das cagarras
que destoam da noite
– como quem ri do homem
não sei
regressam fantasmas
nas exéquias do discernimento
e assim
suspendo as glândulas do conhecimento
com suspiros do abdómen
sacudo o sangue
com gargalhadas redundantes
e tropeço sempre
na minha sabedoria
tenho na retina
um brilho de lâmina
– afiada por dentro
– romba por fora
[Poema publicado na colectânea Cadernos de Santiago I, Lisboa, Âncora Editora, 2016.]